terça-feira, dezembro 02, 2003

CHAPEAU A PEDRO OLIVEIRA, DO BARNABÉ

Com a sua proposta de retirar a palavra anti-colonialismo da Constituição Portuguesa, dizendo provocatoriamente que «os angolanos, os moçambicanos e os timorenses nunca sentiram o racismo que houve noutros impérios», Paulo Portas pretende colocar na agenda da esquerda um assunto que já fez o seu caminho e está esclarecido em dezenas de livros e em milhares de documentos, e não é susceptível de qualquer processo de reescrita que possa ser aceite quer pelos portugueses (que têm a posse da maioria desses documentos), quer pelos africanos das ex-colónias que, ou tomaram conhecimento da história através daquilo a que alguns chamam a oratura popular (a cultura transmitida oralmente através de lendas, histórias e lembranças de acontecimentos) ou além disso viveram ainda parte da opressão colonial. Opressão que existiu, sim senhor.

Salmoura já referiu algures que em plenos anos sessenta, em Cabo Verde, por exemplo, era proibido, em espaços públicos, formar grupos de mais de duas pessoas. Mal se aproximasse uma terceira pessoa, logo vinha a polícia que dava ordem de «dispersar, dispersar»; e muitas vezes, mesmo havendo apenas duas pessoas a falar em local público, a polícia, não mandando dispersar, ordenava «toca a andar, toca andar». Não sabemos porquê mas a ordem era sempre repetida; ouvimo-la vezes sem conta, em S. Vicente, quando andávamos no liceu.

Manda a verdade que se diga também que essas ordens de «dispersar» e de «toca a andar» eram dadas sobretudo a estudantes dos últimos anos do liceu e a adultos que pelo conhecimento que deles tinham as polícias (isso era fácil num meio tão pequeno) poderiam trocar informações consideradas subversivas ou criar laços de união através da comunhão de ideias e de aspirações.

É mais que sabido - é ponto assente - que houve Império Português. E que, nas colónias portuguesas (incluindo Cabo Verde onde tudo foi sempre mitigado - há que dizer a verdade), houve colonialismo; houve escravatura; houve discriminação racial; houve tudo o que essas realidades implicavam e implicaram: opressão, assassinatos, deportações, prisões arbitrárias - o sem-fim de processos e de práticas historicamente associados aos impérios e ao colonialismo. Houve tudo isso.

Mas, felizmente, com o reconhecimento dos erros, a acção do tempo e a adopção de novas regras de convivência entre os povos, a normalidade tem-se instalado e não é um qualquer Paulo Portas da Moderna que tem categoria e peso político e intelectual bastantes para trazer este assunto à mesa da discussão. Ele quer é uma espécie de Magiolo Gouveia II para entreter o pagode.

Por isso concordo plenamente com a posta de Pedro Oliveira, Armadilha para tolos, pois é precisamente disso que se trata: uma armadilha para desviar as atenções de tudo que de mau está a fazer este Governo e dos enormes problemas que ele criou: recessão, penúria nacional, caos nos Serviços de Saúde, etc.; e outros nos quais se meteu: o Iraque, para não irmos mais longe.

Também faço votos para que a oposição não dê troco a esse "mãozinhas" e olhe apenas para a realidade quotidiana deste povo enganado com vários "Carnavais" e míticas "cenouras" que o têm conduzido rumo ao abismo económico e social.