domingo, agosto 10, 2003

PACHECO PEREIRA E O "24 HORAS"

Há já alguns dias (só não o fiz antes por estar de férias) que gostaria de escrever algo sobre o problema tratado por Pacheco Pereira no post intitulado "Também ele" no Abrupto. A saber: o jornal "24 Horas" terá acusado PP de fuga ao fisco ao declarar o seu trabalho para jornais e na rádio como trabalho de autor ("autorias") pagando por isso impostos reduzidos (os autores são assim protegidos por lei), e não "serviços prestados" situação essa em que pagaria mais impostos.

Cabe discutir se um comentário feito na rádio ou escrito nos jornais deve ser considerado trabalho de autor, e, como tal, alvo da aplicação generosa de imposto pelas Finanças, por se tratar de um produto cultural, ou deverá antes ser considerado um produto comercial que, pago como tal, deve, por isso, sofrer um imposto mais consentâneo com esse carácter não cultural.

Pacheco Pereira entende que essa distinção cabe por inteiro às Finanças, e só a ela, e não ao jornal 24 Horas. Sendo isso verdade, não fica, porém, o jornal impedido de dar opinião sobre o assunto.

Ao pretender que o assunto só diga respeito a ele e às Finanças, PP cai em profunda contradição, pois, uma das suas actividades (aquela por que é mais conhecido) é dar opinião: opina muito e bem – diria até, indispensavelmente – sobre os mais variados assuntos; e para não ir mais longe fiquemo-nos por estes três apenas:

1)Uso de foguetes em festas e romarias – competeria apenas ao ministério da Administração Interna tratar disso –;

2) Incêndios – os bombeiros, a protecção civil etc. é que teriam a exclusividade para tratar o problema –;

3) A venalidade ou não de Paulo Portas, abordada há tempos na TSF, – caberia somente aos tribunais discutir o assunto –.

Por aqui se vê que sendo a sua relação com as Finanças um assunto que compete a esta instituição e a ele, pode também, muito bem, ser abordado por um jornal. Não é um assunto tabu, fechado, proibido. Embora seja, até certo ponto, privado. Mas a privacidade tem limites muito largos quando se trata de personalidades públicas como é o caso de PP.

A colaboração paga, duradoura no tempo, rigorosamente agendada, publicitada e publicada com finalidades comerciais – não nos esqueçamos que é com essas "colaborações" valiosas que os jornais, as rádios e televisões ganham cada vez maior audiência e angariam nessa base publicidade cada vez mais cara – não me parece, por estas características, que possa ser considerada "trabalho de autor" (de Pacheco Pereira ou de qualquer outro cidadão).

Por maior simpatia que eu possa nutrir (e sinceramente nutro) por PP, cujas intervenções públicas nos média constituem matéria formativa para os leitores, não posso, contudo, concordar que as suas opiniões, publicadas onde são, se assemelham aos "Irmãos Karamnzov" de Dostoyevski, à poesia de Fernando Pessoa, ou às palestras de George Soros. Por muito que a lei em vigor permita que assim seja classificada para motivos de impostos.

Quanto à ideia deixada por PP de que poderá vir a divulgar as suas declarações de IRS na Internet, penso que, se o fizer, cometerá um grande erro. Em próximo post direi porquê.