quinta-feira, junho 10, 2004

NÃO SE PODE MUDAR DE POVO

De povo que pouco ligava aos símbolos nacionais, hoje o povo português, seguindo, aliás, a sua natural e conhecidíssima tendência de passar do oito para o oitenta (e vice-versa), transformou-se de um momento para o outro e perdeu-se de amores pela bandeira nacional que podemos ver agora desfraldada ao vento por tudo quanto é sítio propício à fixação da dita: telhados e janelas das casas; janelas, tejadilhos, portas e bagageiras dos automóveis; montras de casas comerciais; parapeitos e varandas dos prédios. Não há um único sítio que não esteja ornamentado com uma bandeira portuguesa.

Salmoura acha bem que assim seja: trata-se, como já se disse, de uma reacção natural deste povo ao chamamento ao dever patriótico de apoiar a selecção nacional de futebol.

Não têm razão aqueles que acham que se deveria abster-se de tamanho espectáculo de amor patriótico. Porque este povo é mesmo assim. Agora é a vez do oitenta. Virá depois, de novo, a vez do oito. Naturalmente.

Não se pode mudar de povo, pois não?

P.S. Salmoura pôde constatar que muitas bandeiras que se diz terem sido confeccionadas na China apresentam pagodes chineses em lugar dos castelos amarelos que fazem parte da bandeira portuguesa. Alguém terá escrito que se tratou da «vingança do chinês». E é bem capaz de ser verdade. Porque quem viveu, como Salmoura viveu, alguns anos na China, e conhece bem a minúcia que o chinês coloca no trabalho, só pode concluir que os castelos foram consciente e propositadamente mandados substituir por pagodes chineses por alguém que tinha intenção deliberada de determinar essa alteração. Nenhum desenhador chinês deixaria de copiar rigorosamente os castelos da bandeira portuguesa caso lhe dessem para a mão um exemplar genuíno da mesma.