segunda-feira, junho 16, 2003

PÉROLAS DE UMA TRADUÇÃO

José Colaço Barreiros (quem será este desconhecido?) traduziu para a DIFEL “A Ilha do Dia Antes” de Umberto Eco.
Com muito esforço e um frasco inteiro de lexotan consegui chegar à página 66 das 468 que o romance tem.

Eu que de literatura aprendi apenas o que me ensinei ao acaso, através de leituras desgarradas de obras não referenciadas, dei por mim a classificar este tradutor como o mais besta que até hoje tentou escrever na língua do vate comemorado a 10 de Junho. Senão vejamos – mas antes disso digam-me, por favor, o que posso fazer para ver-me ressarcido do dinheiro, mas sobretudo do tempo gasto com esta porcaria de tradução –.


Aqui vão algumas pérolas elucidativas:

1. Depois de ter escrito (página 56, linhas 34 a 36) «... Roberto compreendia que era qualquer coisa como um Richelieu espanhol, mas menos beijado pela fortuna ...»; (página 63, linha 5), que «…Roberto… havia desenrolhado uma garrafa…»; de nos descrever (página 64, linhas 13 e 14) «…nuvens a liquefazerem-se no céu… como se por ele transitassem bandos de peixes dotados de uma lâmpada interna.»; (página 64, linhas 17 e 18) nuvens «…condensando-se e depositando-se como nata, macia onde escorria para baixo,…» – depois destas pequenas pérolas – somos brindados com dois parágrafos de uma erudição inultrapassável senão mesmo original e incompreensível para mentes vulgares.

2. O primeiro é este (página 65, linhas 6 a 11): «Não, disse-se Roberto, a dor que esta luz provoca nos meus olhos diz-me que não sonho, mas sim vejo. As minhas pupilas sofrem pela tempestade de átomos que, como de um grande navio de guerra, me bombardeiam daquela margem, e não é mais do que a visão que este encontro do olho com o polvorinho da matéria que o atinge.» Não me enganei – é ponto mesmo, é o fim de uma fala.

3. E aqui temos o segundo (página 65, linhas 29 a 37): «Ele estava vivo, em estado de vigília, e lá em baixo, ilha ou continente que fosse, havia uma coisa. O que era essa coisa não sabia: como as cores dependem quer do objecto por que são afectadas, quer pela luz que nele se reflecte, e pelo olho que as fixa, assim a terra mais longínqua lhe aparecia verdadeira no seu ocasional e transeunte conúbio da luz, dos ventos, das nuvens e dos seus olhos exaltados e afligidos. Talvez amanhã, ou daí a poucas horas, aquela terra já seria diferente.» O ponto é mesmo parágrafo

E agora, o que é que eu faço? Vou ao psiquiatra da moda que Amara(l) todos os Dias em tudo que é média; procuro esse tal de José Colaço Barreiros e afinfo-lhe duas naquela corneta enferrujada ou peço à DIFEL que tão erudito tradutor arranjou que me devolva o meu dinheirinho, os juros, o tempo perdido e tudo o mais que há-de vir a acontecer-me devido ao enorme trauma de que sou vítima?

Ajudem-me! Leiam o livro e compreendam a minha aflição.