O ERRO DO BLOCO DE ESQUERDA
Pareceria claro que à esquerda interessa fundamentalmente derrotar a direita em quaisquer eleições que hajam. Mas as coisas não são bem assim.
Atente-se só nisto: noticia-se por aí (ver aqui, aqui, aqui e aqui) que o Bloco de Esquerda pretende concorrer sozinho à Câmara de Lisboa nas próximas eleições autárquicas de Outubro. O Bloco de Esquerda rejeita assim qualquer possibilidade de entendimento com o PS e a CDU no sentido de derrotar uma candidatura da direita. É uma decisão insensata que provém de uma avaliação (quanto a nós errada) que o Bloco faz acerca dos votos que obteve nas últimas legislativas. Os senhores bloquistas estarão por certo convencidos de que reeditarão com toda a facilidade, em Lisboa, a votação que obtiveram nas legislativas de há dias. Isso é pensar que o povo de Lisboa, que, como sabemos, votou maioritariamente à esquerda no dia 20 de Fevereiro, irá votar da mesma maneira que o fez há dias praticando um acto mecânico: como se fosse um robô.
Mas assim não será e o Bloco de Esquerda, a ir sozinho às autárquicas, vai ter uma lição bem grande a aprender.
É que os portugueses evoluíram muito nestes últimos dez vinte anos. Hoje os portugueses pensam a política e decidem o seu voto de acordo com aquilo que observam ao longo do tempo aos protagonistas políticos, e de acordo com aquilo que lhes interessa ou não. Já não vão em cantigas e folclore como, por exemplo, muitos ainda pensaram na última campanha eleitoral. O voto é hoje uma arma que cada eleitor aprendeu a utilizar em benefício próprio. O voto pertence hoje ao eleitor e não ao partido: esta a grande mudança verificada, de eleição para eleição, desde o 25 de Abril até hoje.
A direita apostou, nas últimas eleições, na estupidez dos portugueses e perdeu em toda a linha.
Nem a campanha mediática protagonizada por "analistas" e "comentadores" políticos da direita que enxamearam os média; nem a contratação, pelo PSD, do marketing de um brasileiro pateta que quis fazer de Santana um "menino guerreiro"; nem os apelos ridículos de alguns padres retrógrados; nem a pose de Estado do antigo "Paulinho das feiras"; nada - mas mesmo nada - desviou um milímetro os portugueses da sua decisão de votar maciçamente para correr com a direita do poder.
Nada fez mudar o sentido do voto maioritário dos portugueses:
Marcelo foi engraçado na TVI mas as opiniões de Marcelo não mudaram em nada o pensar dos portugueses. Os padres, respeitados como representantes da Igreja Católica, mas sem que ninguém acredite já que têm alguma coisa a ver com Deus, viram os apelos de voto feitos a partir do púlpito das igrejas caírem positivamente em saco roto.
O aproveitamento político escandaloso da morte e do funeral de Lúcia não rendeu um tostão furado à direita ridiculamente enlutada e contristada que se apresentou em campanha.
Isto quer dizer que o Portugal de Salazar deixou definitivamente de existir. Hoje temos o Portugal de Abril . Um Portugal informado e capaz de decidir pensando. Não mais tomando decisões com o coração ao pé da boca.
Enganam-se por isso redondamente, e mimam o erro monumental que conduziu a direita ao fracasso nas últimas legislativas, aqueles da esquerda que pensem que conquistaram em definitivo o voto dos portugueses e que por isso podem muito bem escolher o caminho que quiserem sem que isso os penalize.
Os lisboetas têm uma avaliação muito negativa deste executivo camarário que tem brincado no dia-a-dia com a sua paciência obrigando-os a andar numa Lisboa atravancada de carros - só por causa de um túnel que mais não é do que a obstinação de um autarca maluco que vê os cargos que ocupa como palcos a partir dos quais faz representações para uma plateia embasbacada e não como uma missão em prol de quem o elegeu -. Os Lisboetas sabem claramente que o actual executivo camarário nada fez até hoje de relevante para a cidade e para os munícipes.
É contra este imobilismo e esta falta de jeito para gerir a sua autarquia que os lisboetas votarão nas próximas legislativas.
Por isso os lisboetas não desperdiçarão o seu voto numa qualquer candidatura que não tenha possibilidades efectivas de derrotar a da direita. Por isso o Bloco de Esquerda sofrerá uma enorme sangria de votos se persistir em pensar que é ele, Bloco, o dono desses votos e não os eleitores que lho deram nas últimas legislativas.
A ver vamos se assim não será.